As declarações de Teixeira dos Santos à RTP 1, na “Grande Entrevista”, são interpretadas como mais uma provocação do Governo, em tempo de negociação
O líder do Executivo madeirense reagiu ontem à entrevista do ministro das Finanças, Teixeira dos Santos à RTP, acusando o governante de desencadear uma campanha para deturpar a Região Autónoma.
Em conferência de imprensa, realizada na Presidência do Governo Regional, na Quinta Vigia, Alberto João Jardim afirmou que o objectivo de a estratégia do governante é «desviar as comparações com os dados das contas públicas que demonstram que o Estado é desmesuradamente mais despesista que a Madeira».
«Utilizando a margem de tempo parlamentar que com boa-fé foi concedida, o Governo socialista, através da comunicação social e sem direito a contraditório, desencadeou uma campanha procurando deturpar a “inimiga” Região Autónoma da Madeira», declarou o líder madeirense, acrescentando que «na situação em que Portugal se encontra, o Estado vai derramando dinheiro dos contribuintes pelas ex-colónias, mesmo as mais ricas do que nós».
Dívida paga em parte com verbas das privatizações
Na entrevista, Teixeira dos Santos afirmou que a República assumiu a dívida pública da Madeira no governo chefiado por António Guterres, em 1999. «Ao contrário do que diz o ministro das Finanças, não é verdade que a República tenha assumido dívida pública da Madeira. Nos termos da lei n.130/99 de 21 de Agosto, foram entregues à Região Autónoma as suas verbas pelas privatizações, utilizadas para abater para abater parte da dívida pública», esclareceu Alberto João Jardim..
Num outro ponto da sua comunicação, o presidente do Governo disse que «a dívida pública que com estas operações ficou a zero foi a dos Açores».
A propósito dos argumentos apresentados por Teixeira dos Santos relativos à diferença do número de ilhas dos dois arquipélagos, Jardim contrariou a «pseudo-justificação do ministro das Finanças sobre as nove ilhas habitadas dos Açores», realçando que «as ilhas do arquipélago da Madeira apresentam 330 habitantes por quilómetro quadrado, tendo o Continente e os Açores 110». Isto para além da Região manter serviços nos pequenos arquipélagos não habitados «a fim de garantir a soberania portuguesa».
Ainda nesta linha de raciocínio, o presidente do Governo sustentou que «a dificílima orografia madeirense implica custos em qualquer investimento, muito superiores ao Continente e aos Açores». Tal como referiu, estes constrangimentos impedem um sector económico primário de relevância, em oposto ao Continente e aos Açores, fazendo com que a Madeira importe mais de 80 por cento do que consome.
Divida madeirense resulta da subtração de dinheiro
Na entrevista à televisão pública, Teixeira dos Santos disse que a Madeira era “despesista”. Jardim esclareceu: «Ao contrário do que diz o Ministro da Finanças, a dívida madeirense não traduz despesismos, mas resulta da subtracção de dinheiro feita à Madeira pelo Governo socialista, simultaneamente à perda que a Região sofreu de Fundos Europeus pelo facto de o investimento realizado a ter desenvolvido e assim implicar a sua saída do Objectivo 1 da coesão europeia. O que, ao contrário do que era pretendido, não nos fez desistir das nossas obrigações de desenvolvimento ante o Povo Madeirense».
Para Alberto João Jardim, e ao contrário do que disse o ministro «o despesismo está provado na situação a que Portugal chegou e na utilização dos dinheiros públicos, não só no Continente, para subsídios eleitoralistas e na perda gritante das oportunidades de investimento que tão cedo não se repetirão».
Depois de apresentar os indicadores que revelam o “despesismo do Estado”, o líder regional afirmou que «é perfeitamente perceptível a estratégia de desviar as comparações dos dados das contas públicas do Estado», acrescentando que «afirmar que existe despesismo na Madeira quando os dados demonstram que o Estado é desmesuramente mais despesita».
Estado português é “desmesuradamente despesista”
Na conclusão da resposta a Teixeira dos Santos, Jardim afirmou que o Governo Regional da Madeira espera que «a oposição na Assembleia da República, coerente com as posições anteriormente assumidas, vote em termos de os portugueses verem se o primeiro-ministro e o ministro das Finanças se demitem, conforme adiantado, a fim de Portugal respeirar e ter Esperança».
Na resposta aos jornalistas, o líder madeirense revelou que não teme eleições antecipadas, salientando que «o país está farto disto e é importante para o país que haja um outro primeiro-ministro e um outro ministro das Finanças».
Relativamente à Lei de Finanças Regionais, cujo processo negocial ainda decorre, Alberto João Jardim, acusou o PS de provocar a «dilação no tempo» do processo de revisão da proposta da Assembleia Legislativa da Madeira «só para ter tempo de movimentar o aparelho contra a Madeira».
Sem querer comentar a fundo a questão «porque as coisas estão a ser conduzidas», o líder regional deixou claro que «tem de haver uma Lei das Finanças Regionais».
«Não vamos trocar essa lei por uma inscrição no Orçamento de Estado de uma verba inferior à que a Madeira tem direito e todos os partidos reconheceram», salientou.
Tal como referiu «não vamos continuar a adiar as coisas, visto tem isto que ser esclarecido antes da lei do Orçamento de Estado».
Jardim realçou que, no actual quadro, a posição da Madeira é a de «não dar qualquer imagem de intransigência, de boicote a qualquer entendimento».
Presidente não se demite se falhar a LFR
O presidente do Governo referiu nunca ter «ouvido o ministro das Finanças dizer directamente que se demitia» e que os jornais «disseram que o primeiro-ministro dizia que o faria».
Jardim mencionou ainda que o Governo da República ao ter entrado nas negociações para a revisão da Lei das Finanças Regionais apenas «meteu o bedelho» neste assunto quando «ninguém lhes pediu nada».
Questionado se se demitia do cargo, caso a proposta não seja aprovada na Assembleia da República, o líder madeirense garantiu que esse é um cenário que agora não se coloca. «Não há razões, em função da conjuntura, para me demitir», disse.
Jardim participa no Conselho de Estado
O presidente do Governo Regional revelou ainda que na próxima quarta-feira vai participar na reunião do Conselho de Estado.
Na reunião, convocada pelo Presidente da República, serão abordados os «desafios do futuro e o novo quadro parlamentar».
De acordo com a Constituição, o Conselho de Estado «é o órgão político de consulta do Presidente da República».
A última reunião do Conselho de Estado realizou-se em Junho de 2009, para discutir a presença de tropas portuguesas no Afeganistão.
Das três reuniões realizadas até essa data, uma incidiu sobre a participação das forças militares e militarizadas portuguesas em operações de paz, outra sobre a dissolução da Assembleia Legislativa da Madeira e a terceira sobre a Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia.
Números reais
A dívida da Madeira é de 21% do PIB da Região, ao passo que a dívida do Estado é de 89,1% do PIB nacional, quando em 2005 era de 68,2%, o que representa um agravamento da dívida do Estado em 47%, em apenas quatro anos. As despesas correntes na Madeira ascenderam a 21% do PIB; no Estado é de 30%. As despesas de funcionamento na Madeira ascendem a 18,5% do PIB; no Estado correspondem a 85% do PIB. As despesas de investimento atingem os 12% do PIB na Madeira, enquanto no Estado correspondem a apenas 0,93% do PIB.
«Teixeira dos Santos mentiu ou enganou-se»
«O sr. ministro mentiu, ou então enganou-se». A reacção é de José Manuel Rodrigues, quando ontem foi confrontado pelo JM com as declarações de Teixeira dos Santos, durante o programa da RTP 1, “Grande Entrevista”. Em causa, as afirmações sobre o pagamento da dívida da Madeira, tendo o líder do PP e deputado na Assembleia da República recordado que o Estado não assumiu 100 por cento da dívida da Madeira, mas sim 70 por cento, por conta de um acerto que estava por fazer entre a República e a Região sobre a receita das privatizações.
Por outro lado, José Manuel Rodrigues admite «alguma verdade» nas palavras do ministro, sobretudo, quando este afirma que «o Governo Regional é despesista e esbanjador». Contudo, acusa o ministro de, por várias vezes, «já ter provado ter má vontade com a Região e usar os números de forma enganosa, o que não é aceitável».
Numa altura em que o país e Madeira passam por extremas dificuldades, o deputado alega que é necessário mostrar sentido de responsabilidade, esperando que na próxima semana isso possa ser revelado por todas as forças políticas na lei de finanças regionais.
José Manuel Rodrigues vai mesmo ao ponto de dizer que o que se impõe é uma reposição da anterior legislação. «Pelo facto de o Governo e o PS, depois de grandes pressões do PSD e do CDS, terem vindo anunciar que estão dispostos a negociar - e isso acontecerá na próxima quinta-feira, na votação na especialidade – já é o reconhecimento de que a lei de 2007 era injusta e que aquilo que a maioria dos partidos andou a dizer é verdade. A própria Unidade Técnica de Apoio ao Orçamento da Assembleia da República concluiu que a Madeira perdeu os 163 milhões de euros nos últimos três anos. E há que reparar esta injustiça através de uma revisão da lei», disse.
A terminar, um concelho: «Há muita politiquice nesta questão. Devia haver maior responsabilidade e sobretudo serenidade e contenção nas declarações».
PSD e Governo voltam a reunir na segunda
O ministro dos Assuntos Parlamentares e o líder da bancada do PSD vão reunir-se uma segunda vez na próxima segunda-feira para tentar chegar consenso sobre a Lei das Finanças Regionais, depois de a reunião de ontem ter sido "insuficiente".
O líder parlamentar do PSD, o deputado eleito pela Madeira Guilherme Silva e o deputado Miguel Frasquilho estiveram reunidos cerca de 45 minutos com Jorge Lacão mas a questão da lei das finanças regionais "não ficou suficientemente tratada", segundo Aguiar Branco. Por isso, acrescentou, ficou marcada uma nova "conversa" na segunda-feira, dia em que termina o prazo, às 12 horas, para a entrega de propostas de alteração.
O deputado admitiu que pode não haver consenso com o Governo, escusando-se a revelar que propostas ouviu por parte de Jorge Lacão e quais os pontos essenciais para o PSD.
"Quando se está a tratar de uma matéria desta natureza, que é importante, significa que para essa segunda reunião pode haver ou não haver conclusões", afirmou.
"Estivemos a conversar, é natural que tenhamos tido conhecimento do que o Governo nos teve para dizer", disse apenas.
Questionado pelos jornalistas, o deputado Guilherme Silva, que assumiu nos últimos dias o papel de interlocutor da posição do PSD no grupo de trabalho, também não adiantou mais pormenores, com o mesmo argumento de que decorre um processo negocial.
A lei das finanças regionais, que baixou à especialidade sem votação em Dezembro, vai a votação final global na sexta-feira da próxima semana.
A nova lei tem um impacto financeiro estimado em 82 milhões de euros em transferências orçamentais. Depois de ter rejeitado publicamente a aprovação da lei, afirmando mesmo que criaria um problema político sério, o ministro dos Assuntos Parlamentares iniciou conversas informais com os grupos parlamentares com o objectivo de chegar a um consenso.
Ontem de manhã o deputado Guilherme Silva criticou o ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, pelas suas afirmações no programa da RTP "Grande Entrevista" sobre o aumento da despesa pública da Madeira. Guilherme Silva considerou que Teixeira dos Santos está a "envenenar a opinião pública com mentiras" e frisou que a atitude do ministro não contribui para um bom clima de negociação. "Mentiu quando disse que o Estado pôs a dívida da Madeira a zeros. Não foi assumir a dívida, foi atribuir à Região as verbas que competiam com as receitas das privatizações, não é uma dádiva. Pode ter sido uma dádiva para os Açores porque o património das empresas privatizadas era significativamente mais significativo na Madeira do que nos Açores", assinalou Guilherme Silva.
Jornal da Madeira
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