domingo, 15 de novembro de 2009

Uma pérola no mar do Norte

O 'yacht Varuna' naufragou há cem anos no mar das Achadas da Cruz, deixando um rasto de mistério. Há histórias que ainda hoje se contam de um colar de pérolas e de um sino que chama para a missa na Fajã da Ovelha.
Data: 15-11-2009










Onda pára o colar de pedras preciosas? O enigma que povoou, há cem anos, o imaginário da população das Achadas da Cruz já só é motivo de curiosidade para meia dúzia. São sobretudo os mais velhos que recordam ainda o naufrágio do 'Varuna'. Mais valioso do que as pérolas transportadas a bordo e cujo paradeiro poucos conhecerão, era o espectacular iate de luxo propriedade do milionário americano Eugene Higgins.

A história do 'Varuna' acaba a 16 de Novembro de 1909. Era madrugada ainda. Higgins cumpria a 27ª travessia transatlântica a caminho de Marselha. O americano tinha partido das Bermudas e encaminhou-se, após uma escala no porto do Funchal, para o mar do Norte.

A bordo do ostentoso iate, viajavam 60 tripulantes, um deles morreu durante a tragédia, e sete passageiros. Higgins fazia-se acompanhar por duas mulheres, um amigo pessoal, o médico e duas criados. No escuro denso, o 'Varuna' navegava perigosamente junto ao calhau das Achadas da Cruz, a Oeste da Ponta do Tristão.

"Para a época, o navio era considerado um super 'yacht'. Tratava-se da jóia do Yacht Club de Nova York", conta o engenheiro Fernando Silva, um dos investigadores empenhados na divulgação da história do 'Varuna'. Traído pelo nevoeiro denso, a embarcação de Eugene Higgins aproxima-se em demasia dos baixios junto à costa das Achadas. Toca o sino a rebate. Soa o pedido de socorro. A população desperta em desassossego.

Aos poucos, vai-se afundado o 'Varuna', um iate com meios de propulsão, velas e máquina a vapor, que fora construído, em 1896, na Escócia, nos estaleiros da empresa A & J Inglis. Há quem fale em descuido do capitão, quem culpe o nevoeiro e quem desconfie de Higgins que terá recebido um montante considerável pelo seguro do iate. A verdade é que as causas do naufrágio continuam a ser um mistério.

Ao pedido de ajuda emitido pelo iate americano, terão respondido os vapores costeiros 'Açor e Gavião'. "Nada puderam fazer, uma vez que a forte ondulação que se sentia na altura não permitia o salvamento", refere Fernando Silva.

Com um custo de construção estimado em 600.000 Dólares Unidos dos Estados (USD), o 'Varuna' apresentava um comprimento aproximado de 90 metros, 10,5 metros de largura e 4,7 metros de calado. Deslocava 1564 toneladas a uma velocidade máxima de 16,5 nós (30,5 Km/h). "Era um iate fantástico, para a época. Tinha mais ou menos o tamanho do Lobo Marinho", afirma o engenheiro.

Restos do 'varuna' na Fajã e no Porto Moniz No início do século XIX, a população das Achadas da Cruz rondava as 700 pessoas. Isolados e com difíceis condições de vida, os habitantes locais não hesitaram em se apoderar do recheio do 'Varuna'.

"O barco transportava muita riqueza, jóias e loiças que, para a época, eram muito valiosas", lembra Marco Gonzalez, outro entusiasta da história do iate americano.

Em 1999, o engenheiro integrou a equipa da secção de mergulho do Clube Naval do Seixal cujas fotografias dos destroços do 'Varuna' reproduzimos nesta reportagem. "Foi qualquer coisa de espectacular encontrar os restos do iate e imaginar o que se terá passado naquela madrugada", recorda.

Cem anos completados amanhã sobre o naufrágio do 'Varuna', ainda são observáveis no local as duas caldeiras, a ossada em metal, o lastro e outros destroços do 'yacht'. O facto de a embarcação se encontrar localizada junto ao calhau, a pouca profundidade, facilitou a pilhagem. "Logo após o naufrágio, as pessoas agarraram a oportunidade de encontrar peças valiosas para a época", declara Marco Gonzalez.

Entre as peças retiradas do local, destaca-se o sino que se encontra actualmente instalado no campanário da Capela de São Lourenço, na freguesia da Fajã da Ovelha. A população mais antiga fala também num colar de pérolas desaparecido. São várias as versões. Uma delas aponta para um padre que terá vendido as pedras preciosas à medida das suas necessidades. Do paradeiro das loiças, nada se sabe. Em jovem, Moisés Açafrão, um comerciante das Achadas da Cruz, chegou a ouvir comentários sobre a existência de peças em várias casas nas Achadas da Cruz. "Infelizmente, essas são histórias que se perderam e já ninguém fala sobre 'Varuna'", lamenta o popular.

Mais recentemente, Moisés Açafrão ainda ouviu falar sobre a retirada do 'ferro' do 'Varuna' que terá sido usado na construção de um hotel no Porto Moniz. Ao certo, ninguém conhece os verdadeiros contornos do naufrágio do iate de luxo, realça o comerciante.

Há mesmo quem defenda que Eugene Higgins terá planeado o naufrágio para beneficiar do seguro. A tese é suportada pelo facto de o milionário ter estado hospedado, um ano antes da tragédia , na Ponta Delgada, e por ter encaminhado, na madrugada de 16 de Novembro de 1909, sob um mar bastante agitado, os salva-vidas para a freguesia, ao invés de seguir para o Porto Moniz, um porto mais perto das Achadas. Higgins morreu em 1948 no Reino Unido, aos 88 anos, deixando para trás um rasto de perguntas. Já o 'Varuna', o que resta do espectacular iate, jaz no mar das Achadas da Cruz. À medida que desaparece a embarcação, perde-se a memória de uma história que, insiste Moisés Açafrão, "vale a pena contar".


DN Madeira



Tirado do site do CEHA:

".....Um acontecimento verdadeiramente sensacional para esta e mais freguesias limítrofes foi o do naufrágio do yacht americano Varuna. Este navio saíra das Bermudas a 7 de Novembro de 1909, com destino à Madeira, trazendo a bordo o seu proprietário, o milionário americano Eugene Higgins, e naufragou nas costas da freguesia das Achadas da Cruz pela madrugada do dia 16 do referido mês. O mar estava calmo, atribuindo-se o sinistro à cerração que fazia, e parece que em boa parte ao descuido do timoneiro e vigias de bordo. Salvou-se o proprietário do Varuna e três senhoras que o acompanhavam, o capitão e mais oficiais, tendo morrido apenas um marinheiro. Era um barco luxuoso, que várias vezes visitara o nosso porto, tendo cerca de 50 tripulantes e a lotação aproximada de 1600 toneladas. Pouco depois do encalhe, começou uma grande agitação do mar, impedindo o salvamento regular dos pertences do navio e dos valiosos objectos que trazia a bordo. A violência das ondas foi-se encarregando da destruição do yacht, arrojando às costas vizinhas e impelindo para o alto mar os preciosos destroços do naufrágio. Afirma-se que o milionário americano perdera neste sinistro um riquíssimo colar de pérolas da mais pura agua, bordando-se em torno do suposto encontro da preciosa jóia varias invenções e fantasias que nos parecem destituídas de qualquer fundamento sério....."

http://www.ceha-madeira.net/elucidario/a/ach5.html



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