Os trabalhos de reconstrução não implicaram uma intervenção na estrutura do prédio onde está localizado o Centro Comercial Anadia
Foi um dos locais que mais deu que falar logo após o temporal de 20 de Fevereiro. A suspeita de que estariam corpos no interior do parque de estacionamento, fez do Anadia e de todos os parques de estacionamentos dos centros comerciais da baixa da cidade um dos focos de atenção da comunicação social.
Conforme o tempo passava e o nível da água diminuia, foi-se percebendo que afinal não havia corpos, que os estacionamentos não se tinham transformado em cemitérios e os boatos afinal não passavam disso mesmo, informações falsas.
O dano que tudo isso causou na imagem dos centros, especialmente do Anadia, não está calculado. O que já se sabe é o valor do prejuízos físicos produzidos pelo aluvião. De acordo Gonçalo Henriques, administrador da Lidosol, empresa proprietária do Anadia, os danos causados orçam os 2,5 milhões de euros.
Os trabalhos de recuperação já estão bem avançados e no dia 18 de Maio o centro comercial deverá abrir portas, o mesmo acontecendo ao piso “-2” do estacionamento. O supermercado demorará mais umas semanas até que seja reaberto. A data prevista é 9 de Junho.
Logo após a catástrofe, os trabalhos de reconstrução iniciaram-se. As obras não implicaram uma mexida na estrutura do edifício. As intervenções concentraram-se nos «acabamentos e equipamentos», onde a reconstrução foi total.
«Mudámos tudo o que eram pavimentos, tectos, iluminação, o ar condicionado, os equipamentos dos elevadores, das escadas rolantes, etc.», disse Gonçalo Henriques, explicando que a substituição total foi inevitável, uma vez que os equipamentos estiveram sujeitos às águas e lamas durante muito tempo.
Quando os visitantes entrarem no dia 18 no Centro Comercial Anadia, verão o espaço «totalmente alterado», apresentando uma imagem «mais actual e mais moderna». Além das alterações na arquitectura de interiores, a empresa proprietária do centro fez uma alteração do logotipo. «Vai mudar tudo», disse Gonçalo Henriques, anunciado a existência de algumas campanhas publicitárias com vista a apresentar o “novo” centro.
«Naturalmente, que já estão previstas determinadas situações para voltar a trazer as pessoas ao Anadia» e às 45 lojas do centro comercial, disse.
A administração do centro tratou de reconstruir e modernizar os espaços comuns, mas cabe a cada lojista assumir os encargos com as despesas das suas lojas. E nem a renda sofre alterações. No tempo em que esteve encerrado os pagamentos ficaram suspensos mas a partir do momento em que seja reaberto a renda volta, e sem desconto.
Tal como explicou o administrador da empresa Lidosol, os trabalhos de reconstrução do edifício não implicaram uma intervenção na estrutura do prédio, porém houve a necessidade de fazer uma pequena mudança no quadro eléctrico que acciona as bombas de escoamento de água, deslocando-o do piso “-2” para o piso “1”.
Aparentemente, esta medida parece de somenos importância, mas se no dia do temporal o quadro eléctrico já estivesse no piso “1” o escoamento da água do estacionamento nunca duraria um mês, como aconteceu.
Como foi noticiado na altura, a existência de um ribeiro subterrâneo ao lado do edifício obriga a que haja um sistema de extracção de água no prédio. Quando foi construído o Anadia, foi feita uma caleira subterrânea a toda a volta do prédio, que recebe a água e a encaminha para as quatro bombas existentes, sendo aquela depois escoada para o exterior do edifício através destas.
O projecto optou por este sistema em vez de paredes estanques, porque assim reduz a pressão sobre a estrutura do edifício.
«Há furos em determinadas partes do edifício, por causa desse ribeiro que existe. A água entra, é direccionada para essa caleira que há à volta de todo o prédio e depois é encaminhada para as bombas que retiram a água. E isto sempre funcionou assim desde que em meados da década de 1990 o Anadia abriu», explicou Gonçalo Henriques.
Porém, o sistema, até agora eficaz, expôs uma frangilidade no temporal, quando foi necessário fazer um corte geral de energia. Ao fazê-lo, as bombas de escoamento deixaram de trabalhar e o parque encheu. Ora, como o quadro estava no piso “-2” e para ligar as bombas era necessário ir lá e carregar no botão, foi preciso primeiro tirar toda a água, o que demorou algumas semanas.
«Estávamos sempre a retirar água (com bombas amovíveis dos bombeiros), mas estava sempre a entrar» em quantidades anormais, dado que não só o ribeiro subterrâneo trazia mais do que o habitual, como também a construção inacabada de um prédio vizinho do Anadia, no lado da Rua do Ribeirinho, transformou-se num reservatório de água.
«Foi por isso que demorou muito mais tempo a retirar a água», explicou Gonçalo Henriques.
«Tínhamos quase a certeza
absoluta que não estava ninguém»
Enquanto a água permanecia no interior dos parques, cá fora as dúvidas sobre a existência de cadáveres no interior do estacionamento ganhavam cada vez mais força, alimentadas por notícias que avançavam até o número de corpos retirados, o que nunca aconteceu, apesar de haver quem tivesse garantido o contrário.
Gonçalo Henriques não entende a razão para o aparecimento dessas afirmações, mas admite que, em certo momento, até duvidou sobre se tinha ficado mesmo alguém retido no parque, tal era a quantidade de notícias que saíam.
O administrador tinha a garantia de que tudo tinha sido verificado antes de ser cortada a energia e encerradas as portas, pelo que havia «quase a certeza absoluta» de que não tinha ficado ninguém para trás.
«Só não posso dizer “a certeza absoluta” porque alguém poderia ter-se escondido. Como havia tantas notícias, pusemos essa hipótese», reconheceu, ainda que houvesse «99%» de certeza do contrário.
Quando a água foi retirada e os 23 veículos retidos surgiram, confirmou-se que não havia mortos, nem os carros se encontravam em fila na zona de saída, num hipotético desespero dos seus condutores para salvar os veículos.
«Muitos estavam no seu lugar, alguns estavam deslocados, porque foi muita água e, se calhar, ficaram a boiar», explicou o administrador, garantindo ser «completamente falso» que houvesse carros em fila para sair.
«Lamento não ter gravações das câmaras»
Gonçalo Henriques tem a informação também de que as pessoas que se encontravam no centro não se «assustaram assim tanto». Houve até quem tivesse conseguido tirar o carro antes do edifício encerrar.
«Apesar de haver muita água a entrar pelas rampas, sendo uma área tão grande não se tornava assustador», disse, considerando que havia «tempo mais do que suficiente para fazer a evacuação».
«É impressionante como é que havia pessoas ou jornais a quererem dar notícias do número de mortos, sem qualquer base», referiu, lamentando o episódio «especulativo».
«Eu tenho pena que não tenhamos as gravações das câmaras de CCTV (Câmaras e Circuito Fechado de Televisão), que foram das primeiras coisas a desligarem-se», apontou ainda Gonçalo Henriques, acrescentando que se existissem as gravações, as pessoas «teriam a noção do que estou a dizer».
Hoje, o assunto está esclarecido, mas na memória de muita gente permanecem os momentos de ansiedade que se viveram logo após o temporal. O cemitério que alguns jornais disseram que o Anadia se tinha transformado, afinal nunca existiu. Mas a imagem ficou. Resta agora saber se o Anadia continuará a ser um dos centros mais procurados da cidade. O tempo dirá.
Ribeira de João Gomes mais desobstruída
A zona do Campo da Barca ao Anadia foi uma das mais atingidas pela intempérie que assolou a Madeira no passado dia 20 de Fevereiro e também uma das que mais demorou a ter a circulação restabelecida.
O elevado grau de destruição levou a que, na recuperação, fossem já tomadas medidas de futuro, nomeadamente a transferência de alguns serviços instalados em estruturas sobre as pontes criadas na Ribeira de João Gomes.
A bomba de gasolina foi disso exemplo, mas não o único, também os tanques de gás foram transferidos, a par de outras estruturas. O objectivo foi libertar as ribeiras do maior número possível de obstáculos, em caso de novas cheias.
A intempérie de 20 de Fevereiro destruiu também certas zonas das margens da ribeira. Uma parte já foi reconstruída, permitindo que a circulação pudesse voltar a fazer-se normalmente. Mas há ainda um trabalho que está guardado para o futuro e que resultará dos estudos que estão a ser feitos dos leitos das ribeiras.
Para já, foram realizadas obras que permitiram regressar ao normalidade. Além do já referido, foram repavimentadas as estradas da zona e reinstalado o sistema de samaforização, que só ao longo de todo o eixo da Ribeira de João Gomes representou um investimento para a Câmara Municipal do Funchal de 96 mil euros.
Lidosol teve prejuízo de 10 milhões
A empresa Lidosol, responsável pelo Centro Comercial do Anadia, pelos estacionamentos, habitações, escritórios e hotel do Funchal Centrum, e vários parques de estacionamento na baixa da cidade teve um prejuízo global de 10 milhões de euros, devido ao temporal de 20 de Fevereiro.
Só no Funchal Centrum foram seis milhões de euros - sem contar com os estragos no Dolce Vita, pois o centro foi vendido ao grupo Amorim -, aos quais se juntam mais 2,5 milhões de estragos no Anadia e 1,5 milhões de euros em vários outros parques de estacionamento e parcómetros.
A empresa espera, contudo, ir buscar «entre 50% a 60%» do valor dos prejuízos às companhias de seguros.
«Felizmente, os seguros estavam bem feitos e temos muitas situações seguradas», referiu Gonçalo Henriques, administrador da empresa Lidosol.
Jornal da Madeira
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